CNJ: Pedido de Providências – Art. 20 da Resolução CNJ nº 228/2016 – Documentos anteriores à Resolução – Ato jurídico perfeito e segurança jurídica – Reconsideração da decisão anterior – Análise do órgão pleno do Conselho Nacional de Justiça, recomendando a revogação do art. 20 da Resolução n. 228/CNJ, visto que viola preceito fundamental disposto no art. 5º, XXXVI, da CF/88.

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – 0006637-35.2016.2.00.0000
Requerente: CENTRO DE ESTUDOS DAS SOCIEDADES DE ADVOGADOS – CESA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
Advogado: DF42930 – NATALIA ALVES BARBOSA

EMENTA

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. REVOGAÇÃO DO ART. 20 DA RESOLUÇÃO 228/CNJ. VIOLAÇÃO DO ART. 5º, XXXVI DA CF/88. CONSECTÁRIOS DO ATO JURÍDICO PERFEITO E DA SEGURANÇA JURÍDICA.

1. Não há como a Administração, na edição de ato normativo regulamentar, afastar consectários constitucionais previstos com garantia fundamental, cláusula pétrea por excelência.

2. Recurso administrativo provido.

ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, deu provimento ao recurso e julgou procedente o pedido para revogar o artigo 20 da Resolução 228/CNJ, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 21 de setembro de 2017. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros João Otávio de Noronha, Aloysio Corrêa da Veiga, Carlos Levenhagen, Daldice Santana, Fernando Mattos, Rogério Nascimento, Norberto Campelo, André Godinho, Maria Tereza Uille e Henrique Ávila. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Presidente Cármen Lúcia, Bruno Ronchetti e, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Regional do Trabalho, da Justiça do Trabalho e do Ministério Público Estadual.

RELATÓRIO

EXMO. SR. CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA, MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:

Trata-se de recurso administrativo interposto por CENTRO DE ESTUDOS DAS SOCIEDADES DE ADVOGADOS – CESA contra decisão que determinou o arquivamento do presente pedido de providências (Id 2103534).

Em suas razões, a parte reitera os argumentos acerca da necessidade de revogação do art. 20 da Resolução n. 228/CNJ.

Afirma que a imposição de data limite para apresentação de documentos estrangeiros legalizados anteriormente à 14 de agosto de 2016 fere os consectários do ato jurídico perfeito e da segurança jurídica, uma vez que a sua validação por Embaixadas e Repartições Consulares implica em legitimação do ato para produzir plenos efeitos em território nacional (Id 2118041).

Por fim, requer seja reconsiderada a decisão de Id 2103534, de modo a ser alterada a Resolução n. 228/CNJ, ante a revogação do seu art. 20, fazendo com que os documentos legalizados no exterior antes da entrada em vigor do referido ato normativo mantenham seus efeitos, sem limitação temporal e sem a necessidade de apostilamento.

É o relatório.

VOTO

EXMO. SR. CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA, MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:

A Segurança Jurídica, delineada como princípio, pode ser subdividida em duas concepções, subjetiva e objetiva, a saber:

“A segurança jurídica é entendida como sendo um conceito ou um princípio jurídico que se ramifica em duas partes, uma de natureza objetiva e outra de natureza subjetiva. A primeira, de natureza objetiva, é aquela que envolve a questão dos limites à retroatividade dos atos do Estado até mesmo quando estes se qualifiquem como atos legislativos. Diz respeito, portanto, à proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada (…). A outra, de natureza subjetiva, concerne à proteção das pessoas no pertinente aos atos, procedimentos e condutas do Estado, nos mais diferentes aspectos de sua atuação” (COUTO E SILVA, 2005, p. 3-4).”

O aspecto subjetivo acima mencionado retrata o conceito do princípio da confiança, do qual é possível retirar a necessidade de a Administração transmitir ao particular segurança em relação ao reconhecimento de atos já praticados ante a presunção de legitimidade, inerente aos atos administrativos lato senso. Isso nada mais é do que o efeito podrômico conferido pela doutrina aos atos administrativos.

Conforme reiterado pela parte nas razões do recurso administrativo (Id 2118039), não há como a Administração, na edição de ato normativo regulamentar, afastar consectários constitucionais previstos com garantia fundamental, cláusula pétrea por excelência.

Assim, de acordo com art. 5º, XXXVI, da CF/88: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Nota-se que a expressão lei contida no dispositivo acima mencionado deve ser interpretada de forma ampla e irrestrita, abarcando, inclusive, os atos proferidos por órgãos pertencentes aos poderes institucionais, dentro dos quais, enquadra-se este Conselho Nacional de Justiça.

Por este motivo, os documentos estrangeiros regularizados nos termos da legislação de regência anterior à edição da Resolução n. 228/CNJ, não podem ser condicionados à posterior legalização, visto que já constituem ato jurídico perfeito. Entender de modo diverso seria desrespeitar a orientação do próprio constituinte originário, o que não é permitido em hipótese alguma em um estado constitucional de direito.

O condicionamento descrito no art. 20 da Resolução n. 228/CNJ, somente seria possível em casos extremos, onde os documentos estrangeiros não teriam findado o trâmite de legalização e consequente validação em território nacional.

De outro modo, os documentos legalizados em período anterior a 14 de agosto de 2016, por Embaixadas e Repartições Consulares brasileiras em países signatários da Convenção de Haia, permanecem produzindo os mesmos efeitos, posto que encerram todas as exigências feitas à época da sua validação.

Assim, reconsidero a decisão de arquivamento proferida sob o Id 2103534 e submeto a presente análise ao órgão pleno deste Conselho Nacional de Justiça, recomendando a revogação do art. 20 da Resolução n. 228/CNJ, visto que viola preceito fundamental disposto no art. 5º, XXXVI, da CF/88.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso administrativo.

É como voto.

Brasília, 29.09.2017.