CSM|SP: Registro de Imóveis – Desapropriação – Descrição que obsta a localização da área destacada em relação ao imóvel desapropriado – Conferência do memorial descritivo por meio de software, tendo sido obtida localização diferente da esperada – Inobservância do princípio da especialidade – Dúvida procedente – Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 0002933-39.2015.8.26.0383, da Comarca de Nhandeara, em que são partes é apelante DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE NHANDEARA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E PÉRICLES PIZA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 24 de maio de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 0002933-39.2015.8.26.0383

Apelante: Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Nhandeara

VOTO Nº 29.757

Registro de Imóveis – Desapropriação – Descrição que obsta a localização da área destacada em relação ao imóvel desapropriado – Conferência do memorial descritivo por meio de software, tendo sido obtida localização diferente da esperada – Inobservância do princípio da especialidade – Dúvida procedente – Recurso improvido.

Cuida-se de recurso de apelação tirado de r. sentença da MM. Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Nhandeara, que julgou procedente dúvida suscitada para o fim de manter a exigência de que se identifique, com precisão, o imóvel desapropriado, no tocante a sua localização no globo, com observância da Lei 6.015/73 c.c. Lei 10.261/01, em obediência ao princípio da especialidade.

A apelante afirma, em síntese, estarem presentes todos os requisitos necessários para efetivação do registro, uma vez que os documentos exibidos à Oficiala possibilitam a identificação do imóvel desapropriado, cuja descrição se houve pelo sistema UTM e não pelo sistema adotado pela apelada. Aduz que a desapropriação é forma originária de aquisição da propriedade, não tendo o procedimento expropriatório escopo de identificar um imóvel rural, seus limites e confrontações e sim de incorporar o bem ao patrimônio público, não sendo extrapolados os limites do imóvel original e, portanto, não havendo ofensa ao princípio da especialidade objetiva. Argumenta com a incidência do art. 176-A, parágrafos 1º, 2º e 3º da Lei 6.015/01.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

À luz do art. 176, II, 3, da Lei de Registros Públicos:

“Art. 176 – O Livro nº 2 – Registro Geral – será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.

II – são requisitos da matrícula:

3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:

a – se rural, do código do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área;

b – se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver.”

Já o art. 225 da mesma Lei dispõe:

“Art. 225 – Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário.

§ 1º As mesmas minúcias, com relação à caracterização do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro.

§ 2º Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior.”

Referidas normas externam o princípio da especialidade e destinam-se a assegurar que a totalidade dos imóveis esteja precisamente individuada. A identificação há de ser tal que permita a quem a leia ter integrais condições de identificar os limites da área imobiliária objeto da matrícula. Somente quando satisfeitas as exigências legais e devidamente matriculado o imóvel é que registros e averbações futuras poderão ser validamente efetuados.

Ademais, à míngua da precisa descrição geodésica do imóvel, tampouco se consegue identificar a parcela sobre a qual recai a desapropriação cujo registro se almeja.

Em situação análoga, este Egrégio Conselho Superior da Magistratura tem reiteradamente decidido pela procedência da dúvida:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA JULGADA PROCEDENTE – RECUSA DE INGRESSO DE CARTA DE SENTENÇA – INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO – DESMEMBRAMENTO DO IMÓVEL DESMEMBRADO, DANDO ORIGEM A QUATRO NOVAS MATRÍCULAS – NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO DAS ÁREAS DOMINANTES EM CADA UMA DAS ÁREAS SERVIENTES DESMEMBRADAS – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ESPECIALIDADE OBJETIVA E DA CONTINUIDADE – RECURSO NÃO PROVIDO.

Em suma, é a matrícula que define, em toda a sua extensão, modalidades e limitações, a situação jurídica do imóvel, razão pela qual, para fins de registro de instituição de servidão administrativa, que consiste em restrição (ônus) ao direito real, devem ser observados os princípios registrários, no caso, o da especialidade objetiva e o da continuidade, o que não se verifica no caso vertente.” (Apelação Cível nº 9000003-56.2014.8.26.0082, 29/9/15, Rel. Des. Elliot Akel; no mesmo v. acórdão, estão citados os seguintes precedentes: Apelações Cíveis números 745-6/1; 1.204-6/1; 943-6/5 e 0017110.60.2008..8.26.0348, 0001619-65.2014.8.26.0586, 9000002.71.2014.8.26.0082 e 0001243-53.2013.8.26.0315)

Diversamente do quanto sustentado pelo recorrente, não foi reconhecida afronta ao princípio da continuidade, uma vez que se cuida de modo originário de aquisição da propriedade. O que motiva a recusa da Oficiala é a ofensa ao princípio da especialidade objetiva, considerando que: (1) da descrição da matrícula e da descrição da área desapropriada, não é possível localizar a área destacada em relação ao imóvel original; (2) a análise do memorial descritivo por meio de software criado para conferência e gestão de trabalhos topográficos de retificação de imóveis rurais implicou a obtenção de localização distinta da esperada.

Por fim, o art. 176-A, da Lei de Registros Públicos, citado pelo apelante, que havia sido incluído pela Medida Provisória n. 700, de 8 de dezembro de 2015, teve vigência encerrada em 17 de maio de 2016.

A notícia pública prestada a partir do registro imobiliário há de ser, primordialmente, precisa. E, na hipótese em berlinda, somente com a correção da descrição do imóvel desapropriado na matrícula imobiliária a informação será suficientemente precisa para se tornar pública.

Note-se que a própria apelante, interessada no registro da certidão, pode providenciar a retificação da área em comento.

Desta feita, bem postada a recusa da Sra. Oficiala, nego provimento ao recurso.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 23.08.2017 – SP)