1ª VRP|SP: Pedido de providências – Doação com reserva de usufruto – Incidência do ITCMD, conforme Lei 10.750/00 – Imposto não recolhido integralmente na ocasião da doação – Exigência do recolhimento da parcela restante quando da consolidação da propriedade em face do nu-proprietário – Improcedente.

Processo 1066337-86.2016.8.26.0100

Pedido de Providências

REGISTROS PÚBLICOS

O.R.I.S.P.

P. do P. R.

Pedido de providências – doação com reserva de usufruto – incidência do ITCMD, conforme Lei 10.750/00 – imposto não recolhido integralmente na ocasião da doação – exigência do recolhimento da parcela restante quando da consolidação da propriedade em face do nu-proprietário – improcedente.

Vistos.

Trata-se de pedido de providências suscitado pelo Oficial do (…)º Registro de Imóveis da Comarca (…), a requerimento de P.P.R., mediante a negativa de cancelamento de averbação de usufruto constate na matrícula de número 64.221.

Sustenta o Oficial que a recusa se deu em razão do recolhimento parcial do ITCMD, uma vez que o imóvel foi doado pelo valor de R$ 214.996,00 (duzentos e quatorze mil, novecentos e noventa e seis), sendo reservado usufruto vitalício do bem, com valor atribuído, para efeitos fiscais, de R$ 107.498,00 (cento e sete mil, quatrocentos e noventa e oito reais), perfazendo o total de R$ 322.494,00 (trezentos e vinte e dois mil, quatrocentos e noventa e quatro reais).

Segue argumentando que seria necessário o recolhimento do ITCMD referente à consolidação da propriedade plena, na pessoa do nu-proprietário, sobre o valor do usufruto, uso ou habitação. Juntou documentação às fls. 8/40.

Alegou o interessado que a exigência não era cabível, pois não constitui fato gerador do ITCMD a extinção do usufruto por conta do falecimento do doador instituidor, já que não há tal hipótese prevista na lei que institui o tributo.

O Ministério Público (fls. 45/48) opinou pela procedência da dúvida.

É o relatório. Decido.

A incidência do ITCMD se dá em conformidade com o artigo 2º da Lei nº 10.705/00, que elenca as hipóteses que geram a necessidade do recolhimento. São elas:

“Artigo 2º- O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

I – por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória;

II – por doação.

§ 1º – Nas transmissões referidas neste artigo, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos forem os herdeiros, legatários ou donatários.

§ 2º – Compreende-se no inciso I deste artigo a transmissão de bem ou direito por qualquer título sucessório, inclusive o fideicomisso.

§ 3º – A legítima dos herdeiros, ainda que gravada, e a doação com encargo sujeitam-se ao imposto como se não o fossem.

§ 4º – No caso de aparecimento do ausente, fica assegurada a restituição do imposto recolhido pela sucessão provisória.

§ 5º – Estão compreendidos na incidência do imposto os bens que, na divisão de patrimônio comum, na partilha ou adjudicação, forem atribuídos a um dos cônjuges, a um dos conviventes, ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão.”

Ao tratar da base de cálculo para o valor do imposto, o artigo 9º, do mesmo diploma legal, estipula que:

“Artigo 9º- A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).

§ 1º – Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.

§ 2º – Nos casos a seguir, a base de cálculo é equivalente a:

1/3 (um terço) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio útil;

2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio direto;

1/3 (um terço) do valor do bem, na instituição do usufruto, por ato não oneroso;

2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa da nua-propriedade.

§ 3º- Na hipótese de sucessivas doações entre os mesmos doador e donatário, serão consideradas todas as transmissões realizadas a esse título, dentro de cada ano civil, devendo o imposto ser recalculado a cada nova doação, adicionando-se à base de cálculo os valores dos bens anteriormente transmitidos e deduzindo-se os valores dos impostos já recolhidos. (Acrescentados os §§ 3º e 4º pelo inciso I do art. 2º da Lei 10.992de 21-12-2001; DOE 22-12-2001; efeitos a partir de 01-01-2002)

§ 4º- Para a apuração da base de cálculo poderá ser exigida a apresentação de declaração, conforme dispuser o regulamento.”

No caso sob análise, houve uma doação com reserva de usufruto, na qual foi recolhido o ITCMD atinente aos “2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa da nua-propriedade”. Foi considerado como base 2/3 (dois terços) do valor de R$ 322.494,00 (trezentos e vinte e dois mil, quatrocentos e noventa e quatro reais), perfazendo R$ 214.996,00 (duzentos e quatorze mil, novecentos e noventa e seis), incindindo sobre esse valor a alíquota, resultando no montante recolhido, de R$ 8.599,84 (oito mil, quinhentos e noventa e nove reais e oitenta e quatro centavos).

Sobreveio, entretanto, o falecimento da usufrutuaria, o que ocasionou novo fato gerador do imposto, conforme previsão legal.

Houve uma decisão normativa CAT-03, de 25 de fevereiro de 2010, tratando deste tema, que dispôs o que segue:

“Decisão Normativa CAT-SP – COORDENAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO – CAT/SP nº 3, de 26.02.2010 – D.O.E.: 27.02.2010. ITCMD – Extinção de usufruto – Não ocorrência do fato gerador do imposto – Doação de bem imóvel com reserva de usufruto – Hipótese não compreendida na isenção constante do inciso II do artigo 6º da Lei 10.705/2000 – Imposto não recolhido integralmente na ocasião da doação – Exigência do recolhimento da parcela restante do imposto, quando da morte do usufrutuário ou da renúncia ao usufruto.

[…]

8 – Nesse caso, com a morte do usufrutuário (ou com a renúncia ao usufruto), consolida-se a propriedade plena na pessoa do nu-proprietário (donatário) e, nessa oportunidade, deverá ser recolhido a parcela restante do imposto referente à doação ocorrida anteriormente (e não referente à extinção do usufruto), que terá como base de cálculo o valor correspondente ao usufruto, isto é, 1/3 (um terço) do valor do bem, devidamente corrigido.

[…]

9.2 – Em relação à doação de bem imóvel com reserva de usufruto, o fato gerador do ITCMD ocorre quando da celebração do contrato ou ato de doação, e é nesse momento que se deve analisar a possibilidade de aplicação da isenção prevista no inciso II do artigo 6º da Lei 10.705/2000 (relativa à transmissão por doação), ou seja, é no momento da doação que se deve verificar o valor efetivamente doado. Estará isenta do imposto toda doação cujo valor transmitido a cada donatário for inferior a 2.500 UFESPS (valor total do imóvel quando existir apenas um donatário).

9.3 – Sendo hipótese de isenção, situação que deve estar consignada no respectivo instrumento de doação, juntamente com o valor do bem e o fundamento legal que deu base ao benefício (§ 2º do artigo 6º do Decreto 46.655/2002), não há que se falar em prova de pagamento do imposto ou “comprovante de isenção” no momento da posterior consolidação da propriedade plena na pessoa do nu-proprietário (donatário), em virtude da morte (ou renúncia) do usufrutuário.

9.4 – Não sendo hipótese de isenção, o donatário, se não efetuou o pagamento integral do ITCMD quando da doação, deverá efetuar e comprovar o pagamento da parcela final do imposto, relativa ao 1/3 faltante, devido na consolidação da propriedade plena, em virtude da morte (ou renúncia) do usufrutuário (§3º do artigo 31 do Decreto 46.655/2002).

[…]

“O imposto a ser cobrado não está vinculado ao fato da morte do usufrutuário, mas sim à consolidação da propriedade em face do nu-proprietário, sendo necessário o recolhimento do tributo, tendo como base de cálculo 1/3 (um terço) do valor do bem, devidamente corrigido”.

Por fim, ao Oficial de Registro cumpre fiscalizar o pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício, na forma do art. 289 da Lei nº 6.015/73, sob pena de responsabilização pessoal.

Diante do exposto, julgo improcedente o pedido de providências suscitado pelo Oficial do (…)º Registro de Imóveis da Comarca (…), a requerimento de P.P.R., mantendo o óbice imposto.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C.

São Paulo, 17 de outubro de 2016

Tânia Mara Ahualli

Juíza de Direito

(DJe de 20.10.2016 – SP)