1ª VRP|SP: Dúvida – Registro de carta de adjudicação – exigência da certidão de casamento – realização de todas as diligências possíveis sem sucesso – mitigação do rigor formal – Dúvida improcedente.

Processo 1062598-08.2016.8.26.0100

Dúvida – Registros Públicos

L. D. G. B.

Dúvida – Registro de carta de adjudicação – exigência da certidão de casamento – realização de todas as diligências possíveis sem sucesso – mitigação do rigor formal – Dúvida improcedente.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 12º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de L. D. G. B., diante da negativa de ingresso para registro da carta de adjudicação expedida pelo MMº Juízo da 3ª Vara Cível do Foro Regional V de São Miguel Paulista (processo nº 0118395-29.2006.8.26.0005), referente ao imóvel objeto da transcrição nº 84.868.

O óbice registrário refere-se à ausência da certidão de casamento do titular de domínio (O. S.) e A. L. M. S., uma vez que a qualificação do varão aponta o estado civil de casado, sem identificação do cônjuge.

Alega o Registrador que a exigência visa assegurar o princípio da continuidade, bem como verificar outros dados que importam na sucessão, como o regime de bens.

Por fim, reconhece que o interessado diligenciou nos limites do possível para obter o documento, mas os resultados foram infrutíferos, sendo certo que nos autos de adjudicação os réus já falecidos foram substituídos pelos seus herdeiros, que expressaram anuência ao negócio jurídico. Juntou documentos às fls.03/68.

Não houve apresentação de impugnação, conforme certidão de fl.69.

O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls.72/73).

É o relatório. Passo a decidir.

Como bem exposto pelo representante do Ministério Público, a exigência e pertinente e se funda na necessidade de assegurar o princípio da continuidade, bem como obtenção de dados referentes ao regime de bens, que importam na sucessão.

Contudo, a impossibilidade da expedição da referida certidão não pode ser óbice ao registro pretendido, sendo que o interessado realizou todas as diligências cabíveis para consegui-la. Da análise dos documentos apresentados, especialmente a certidão de óbito (fl.13), vê-se que o casamento ocorreu na Itália, provavelmente em Milão, não havendo qualquer menção da Serventia onde foi lavrada.

Ademais, na carta de adjudicação expedida pelo MMº Juízo da 3ª Vara Cível do Foro Regional V de São Miguel Paulista, consta que todos os bens do casal foram doados em vida, consequentemente não houve a abertura de inventário (fls.52/60).

Neste contexto, existe a declaração dos dois herdeiros sobre a inexistência do inventário, bem como anuência para a transferência do imóvel objeto do presente feito ao suscitado (fls.61/62).

Assim, deve-se mitigar o rigor formal no caso em tela, com o reconhecimento de que a exigência feita pelo Registrador está muito fora do alcance do interessado, e a situação fática demonstra a total impossibilidade de cumprimento.

Neste sentido as decisões: AC: 0034757-65.2010.8.26.0100, 0021798-28.2011.8.26.0100, 0003611-12.2012.8.26.0625, 0000004-82.2011.8.26.0315.

Observo que o Oficial não pode, e nem deve, analisar outros indícios que provem o estado da pessoa, sob pena de proferir juízo de valor sobre provas, o que só pode ocorrer perante o Corregedor Permanente.

O afastamento do óbice só pode ser feito em Juízo, na forma do artigo 198 da Lei 6.015/73.

O eminente magistrado Marcelo Martins Berthe tratou com muita propriedade da questão:

“Não fogem à regra as normas de natureza jurídico-registral. Embora sejam sempre norteadas pelo rigor da forma, não podem elas passar ao largo dos fatos, desprezando a realidade, em nome de uma pseudo-segurança. Quando, como no caso, não se vislumbra prejuízo a terceiro, nem a qualquer princípio registrário; e sendo possível a superação do óbice formal como se viu, não há porque deixar de atender aos legítimos interesses de todas as partes envolvidas. Não se justifica a forma, pela forma apenas. Aquela só tem cabimento no superior interesse público, que no caso não estará afrontado. Verificado isso, considerando a excepcionalidade e as peculiaridades de cada caso, cabe ao Juiz deliberar pela solução mais adequada, de modo que não se alcance desfecho iníquo, sem nada que justificasse tal apego a esse formalismo, que se revelaria estéril” (proc. 504/1991, 1ª Vara de Registros Públicos).

Por fim, não há qualquer indício de prejuízo a terceiros, devendo consequentemente ser afastada a exigência.

Diante do aqui exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 12º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de L. D. G. B., afastando o óbice imposto.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 11 de agosto de 2016.

Tania Mara Ahualli Juíza de Direito

(DJe de 15.08.2016 – SP)